quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

O direito de ser sujo

Geisy só queria se exibir. Rebolava alegre, bundinha empinada, vestidinho curto, exercendo seu direito de querer ser sexy. Acabou hostilizada por moleques tarados e mulheres invejosas, indignados, tanto pela audácia da loira, quanto pela vontade de possuí-la ali mesmo. O sexo, ou sua insinuação realmente nos perturba, é fato. É só lembrar como padres e bispos agiram sob celibato ao longo de todos esses séculos.

A mídia então se manifestou. A Uniban também. Resolução da faculdade: é proibido ser insinuante, é contra os bons costumes. Estás expulsa! Mas que bons costumes? Somos um povo que respira sexo, transpira luxúria, e faz debates em botequins, resolve seus problemas à base de pizza e cerveja. Não discutimos os problemas verdadeiros que dificultam nosso sucesso como nação civilizada. Debate-se os fatos, os acontecimentos, mas não seus meandros, as causas, as conseqüências, as soluções. Uma era de imediatismo, onde preguiçosamente confortados em nossas poltronas nos informamos sobre o mundo – superficialmente - com alguns cliques no Google. E achamos que sabemos de tudo. Mas o que sabemos? Que proibir uma aluna de exibir suas curvas vai dar mais moralidade ao “ambiente escolar”, e até a própria moça, como uma mulher que deve ser decentemente “digna”?

Eu sei que nada sei. Mas eu sei que agora também é proibido fumar em ambiente público fechado. Ok, concordo em partes. Nunca gostei de ser um fumante passivo (eu, que criticava veementemente quem fumava, hoje também molesto meus pulmões), que dizem alguns ser praticamente um estupro pelas narinas. Tudo bem, vamos respeitar a saúde do outro. Mas proibir fumar em boteco? Quem freqüenta esses singelos e simpáticos ambientes familiares senão sujeitos que querem afagar o estresse do dia, as mazelas da vida, rir um pouco dela com os companheiros de labuta bebendo uma cervejinha gelada em meio à névoa de cigarros baratos?

Mas não me preocupa apenas a proibição de não poder fumar nestes lugares. Sei que o tabagismo já matou mais que regimes totalitários e desastres naturais. O ato de proibir o ato de fumar sim que me preocupa, a privação de exercer seu livre arbítrio, de poder escolher me destruir ou não. Isso sim me preocupa, e esses tipo de proibições trazem em si uma carga reacionária. O Estado não tem o direito de decidir o que é bom ou não para alguém, mas sim garantir os direitos básicos de qualquer cidadão. E isso vale também para o modo de como nos comportamos perante os outros. A escolha de usar vestidos curtos, vestir uma cortina se quiser, ter relação com pessoas do mesmo sexo, isso não pode ser proibido por ninguém. Muito menos uma instituição de ensino superior, que deveria ser o santuário da liberdade de expressão e laboratório de ideias.

Tudo bem, todo governo e instituição pública ou privada tende a ser controladora. O que me perturba na verdade é como a sociedade está descambando para essa tendência. Uma certa higienação exagerada. Não só estética, física, mas ideológica. Quando vejo num comercial o slogan “Para o homem bem feito, barba bem feita”, penso em que tipo de homem estão se referindo? Não devem estar falando do Lula então. Ainda mais pela famosa veia pinguça do chefe. Ou de um pobre trabalhador que não pode ter um Mach 3, aquele que o Kaká usa (mesmo sem ter barba), que bebe e fuma(va) no botequinho perto de casa. Não, não deve ser dele que estão falando.

Num mundo onde as ideologias morreram ou viraram estampa de camisa, onde se valoriza a estética ao conteúdo, o prazer e o sucesso acima de tudo, ainda sim sinto um certo patrulhamento ideológico pelo “clean”, pelo cool, onde você é o que você veste e consome. Quem se veste com marcas é bonito e legal, quem se veste estranho é “descolado”, quem se veste simples é pobre, quem se veste pouco é puta. Todos querem se destacar do gado, mas esse distanciamento, essa exacerbação do eu, do prazer próprio à qualquer custo, só os une num vazio conjunto. E numa limpeza eternamente entediante. Qual o problema de ser sujo? Eu tenho direito de não fazer minha barba, de cheirar a cigarro e tomar um porre, assim como as mulheres tem o direito de serem “cachorras”, sem medo de sermos felizes.

Uma proibição dá margem a outras. Logo defenderão o expurgo definitivo do cigarro. Depois, de beber nas ruas, nos bares, até a proibição do próprio consumo etílico. Nem água beberemos, pois acabará. Encheremos a cara de ki-suco e tubaína. Estará proibido o porre! Que porre de vida será viver num mundo assim, sem bebida, sem cigarro, sem micro-saias, sem rock’ n roll (sim, nem ele resistirá a tanta caretice).

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